O Cocó Empresarial (ou Corporate Poo - em estrangeiro soa sempre mais profissional!)
Vou falar do cocó. Não de um cocó qualquer, mas do cocó que se pratica nas nossas empresas. O chamado Cocó Empresarial. Não é apenas um mero exercício de humor primário e escatológico. Isto é mesmo uma coisa séria.
Desde pequenito me habituei a fazer quase todas as minhas funções fisiológicas (das quais destaco comer e fazer cocó) em casa. Isto era possível porque sempre andei na escola muito perto de casa.
Mesmo quando comecei o meu processo de exílio, quando fui para a faculdade longe da minha amada cidade de Setúbal, guardava sempre o cocó para fazer em casa. É uma coisa especial, que não queremos desperdiçar em sanita alheia. Tem que ser obrado no conforto do lar.
Acontece que, desde que comecei a trabalhar, me fui apercebendo que o local de trabalho iria ser a minha nova casa, pelo menos 8 horas por dia. Assim sendo tive que me habituar a fazer cocó no emprego. Podemos guardá-lo para a noite. Mas não é a mesma coisa. O bom cocó é o que se faz pouco depois de almoço, mas antes da hora do lanche. É esse o momento mais propício, em que ele está pronto a sair nas melhores condições.
Aliás é a essa a hora que quase toda a gente vai "obrar".
Não que se fale nisso. O cocó é, ainda e sempre, um tabu no mundo empresarial. Dir-se-ia que a primeira regra do Cocó Empresarial é "não se fala do Cocó Empresarial" (onde é que eu já ouvi isto?). Mas mesmo não falando nisso, toda a gente sabe onde vai o colega quando se levanta sorrateiramente do seu posto de trabalho, para voltar 15 minutos mais tarde, com um ar mais aliviado e um copo de água na mão (para disfarçar).
Talvez por ser um tabu, o acto da prática do cocó recebe várias designações entre os colegas mais galhofeiros. Entre as minhas favoritas contam-se: os clássicos "arrear o calhau" ou "mandar um fax", "largar o torpedo", "obrar", ou ainda "amandar o barrote". Muito melhores do que o pouco poético "defecar".
É que embora toda a gente saiba que toda a gente também o faz, ninguém gosta de ser apanhado no acto.
Há comportamentos típicos que comprovam isso mesmo. A quem nunca aconteceu entrar na WC mas ver lá algum colega e fingir que se foi lá só lavar as mãos... ou então ficar imóvel e em silêncio dentro da casinha privada, depois de ouvir alguém entrar, à espera que o intruso saia. Caso sejamos surpreendidos à saída só nos resta manter uma pose cool e fazer um comentário inteligente do género "Olá... pois é... cá estamos!".
A vocês nunca aconteceu? Pois... ahhh... mim também não... estava só a falar porque...
Há vários tipos de WCs. As mais apropriadas para a prática do cocó empresarial são aquelas completamente fechadas.
Tendo trabalhado já em 3 ou 4 clientes diferentes, só no decorrer deste ano, tenho visto de tudo.
Já vi umas abertas em cima, outras abertas em cima e em baixo (muito más porque não isolam os sons e os cheiros, e deixam à vista os pézinhos com a calcinha nos tornozelos - haverá coisa mais deprimente?). Nestas, reveste-se ainda de maior relevância o factor silêncio durante o cocó. Chamemos-lhe o "cocó em modo furtivo".
Até já usei umas WCs, as minha favoritas, que ficavam num edifício com as paredes completamente compostas por vidros espelhados de alto a baixo. O cocó com vista para a rua é uma coisa realmente especial. Não é o ideal para a concentração e o recolhimento de espírito necessários para um cocó eficiente... e é realmente estranho ver o nosso reflexo no vidro, mas lá que tem a sua piada, lá isso tem! Algumas colegas achavam que se via de fora para dentro mas eu acho que não... enfim, talvez à noite se visse.
Ora agora voltando ao problema que nos traz aqui.
Eu agora estou numas instalações, onde o engenheiro que pensou nas WCs teve a brilhante ideia de colocar portas de vidro fosco nas privadas. Portanto estamos a falar de portas translúcidas, em que se vê o vulto de quem está lá dentro. E claro que quem está lá dentro também vê o vulto de quem passa. Conseguem imaginar imagem mais perturbadora que esta?
Obviamente as portas também são abertas em cima e em baixo para compôr o ramalhete. Mas a piéce de resistance é que, como acontece normalmente neste tipo de portas, há uma falha de cerca de 5 milimetros entre a porta e a parede. Embora não se espere que nem os clientes, nem os colegas consultores que aqui habitam vão lá espreitar, o que é certo é que se quisessem, eles podiam! Como é possível criar o ambiente de recolhimento, o nosso mundinho reservado, imprescindível ao acto da defecação?
Desde que estou neste cliente nunca mais tive paz intestinal.
Agora digam-me. É possível praticar o cocó (e já agora trabalhar) nestas condições!?